Entre as montanhas vermelhas no norte da Argentina, habitada por uma brisa surpreendentemente fresca e um carnaval de outras épocas, está Jujuy, uma Argentina ardente.
A paisagem, que começamos a avistar ao partir da cidade de São Salvador de Jujuy, em direção ao norte, é de uma aspereza sem tamanho. Cadeias e cadeias de montanhas coloridas, com preponderância para o marsala, que só se intensificam ao longo do dia. Parecem seguir o ritmo do sol desde o seu nascimento, há 60 milhões de anos.
E a altitude, acima de 1.500 metros até os imensos 4.170, traz consigo uma brisa fresca mesmo na tarde quente de verão. Essa brisa que se transforma em noites e manhãs geladas, em uma amplitude térmica admirável.
Jujuy é a província do sol, assim como Salta, que visitamos logo depois. Seus cactos imensos, de mais de 3 metros de altura, já nos avisam: estamos em um deserto, ou quase deserto. Assim dizem as tantas pontes, que recebem correntes de água tão finas quanto persistentes e velozes, apenas no período de chuvas.
Jorge, nosso primeiro motorista, um boliviano cuja família veio buscar melhores condições de vida no país vizinho, me olha como quem vai contar um segredo: – Está vendo esse rio seco, que mais parece um monte de pedras? Agora imagina águas descendo dessa montanha há mais de 5 mil metros de altitude, até os 300 metros ao chegar na cidade mais baixa… leva tudo para frente! Imaginei, obediente.
A Bolívia está logo ali ao lado, menos de 500 km, o Chile também, mas vemos pouco dele por aqui, os costumes, a comida, o artesanato, é muito mais Peru e Bolívia, é coração andino inca, indígena pulsante. Há um orgulho nessa herança, paira também um certo ressentimento “- O Sul (Buenos Aires), não se lembra, não sabe daqui”.
Se não sabe, não sabe o que está perdendo. Se não sabe, ao menos está obrigado a vislumbrar, nas fotos de propaganda de Salta que vemos na capital portenha. Muitas delas com as montanhas de Jujuy.
Embora próximas, Jujuy e Salta são províncias, que no Brasil seriam Estados e suas capitais tem respectivamente o mesmo nome. Salta convida para seu centro histórico colonial e para o encanto de vários pueblitos, cada um com seu atrativo e seu post que virá.
Porque esse é sobre Jujuy e o espanto de como demoramos tanto tempo para conhecer essa beleza, aparentemente tocada apenas pelos que aqui vivem e os muitos new hippies que chegaram e não parecem querer sair.
A cidade de São Salvador de Jujuy
A cidade de São Salvador de Jujuy, também chamada apenas de Jujuy, não tem grandes atrativos turísticos. Uma praça bonita, com bares agradáveis em volta, uma igreja interessante e só. É o seu entorno que atrai.
Ainda assim, Jujuy me trouxe uma das memórias mais impactantes dessa viagem. Ao acordar cedo para conhecer as Salinas Grandes, abri a janela do quarto e me deparei com essa vista. Parece piegas, pode ser piegas, mas me emocionei com tanta beleza.
Purmamarca
A cidade de Purmamarca, que mais parece um povoado, é famosa por deter o Cierro de Siete Colores, ponto principal de peregrinação turística. Mas não é apenas isso, o passeio dos colorados e a animação da feira de artesanato da cidade, agregam charme ao passeio.
Não que o Cierro de siete colores não seja imponente e lindo, mas seria pouco resumir a cidade a ele. Inclusive, pela quantidade de lojinhas, hotéis, pousadas e restaurantes, acho que é um bom lugar para se hospedar.
Seguindo por uma estradinha, ao lado do Cierro de siete colores, está o Paseo de los colorados, diversas pequenas montanhas de cores fortes e picos.
Acreditam que esse caminho é energicamente benéfico para a saúde pela vibração da cadeia de montanhas. Uma curiosidade local, em Purmamarca e nos vilarejos vizinhos, é que os cemitérios estão sempre na parte mais alta das cidades, para que os mortos acendam mais rápido ao céu
A praça principal de Pumamarca é o local onde acontece a famosa feira de artesanato. Em tal praça há wi-fi livre! Incrível por ser um lugar tão remoto. Purmamarca me pareceu a Praia do forte de Jujuy, um lugar descolado, muito cheio no feriado, com artesanato e lojinhas de qualidade. Compramos alfajores em uma linda embalagem, perfeita para dar de presente. Certamente é um lugar mais divertido de se hospedar do que Jujuy.
Tilcara
Tilcara é controversa, apenas há 25 km de Purmamarca, seu principal atrativo são as ruínas incas da Pulcará de Tilcara. Um sítio arqueológico que pretende mostrar os hábitos dos Tilcaras, índios pré hispanicos, que foram dominados pelos incas no Séc. XI e depois pelos espanhóis no Séc. XVI.
Achei o povoado bem interessante, estava cheio em virtude do carnaval, mas não tivemos tempo de conhecer. Muitos criticam Tilcara, acredito que é injusto. Acontece que as ruínas incas ali propagandeadas não são originais, foram completamente (e segundo os próprios guias) mal restauradas.
Acho que a condução do passeio que não é legal, embora os guias tenham o dever de nos orientar sobre o que foi feito de restauração e os erros do processo, achei um pouco triste o passeio. É que quase nada de bom foi dito, apenas críticas ao estado em que o sítio histórico foi deixado e um pouco de história. A entrada só é permitida com guia do próprio parque
Ainda assim achei que valeu a pena, o sítio histórico tem um Jardim botânico de cactos , pequeno é verdade, e uma vista bem bonita.
O ingresso custa 300 pesos, certa de 30 reais por pessoa, com direito ao guia.
Maimará
A principal atração de Maimará, no caminho para Humahuaca é a cadeia de montanhas chamada Paleta del Pintor. É que as cores da montanha são tão bem divididas que aparentam ter sido separadas como as tintas de uma paleta.
É um lugar obrigatório, onde há apenas um mirante e um despenhadeiro. Vimos um chapéu desavisado voando da cabeça de sua dona direto para ele, sem chance de ser recuperado. Então, cuidado com os pertences, já que o vento é forte e a descida impossível.
Humahuaca
Humahuaca é uma lindeza, uma pequena cidade a 3.000 metros de Altitude, cheia de lojinhas, confeitarias, um grande armazém que vende a cerâmica da região direto dos produtores e o melhor restaurante com opções vegetarianas de toda viagem.
Há também uma praça agradável em frente à igreja em que, pontualmente ao meio dia, o Santo sai de um trilho e aparece frente aos fiéis. Segundo o nosso motorista, é o grande atrativo da cidade, junto com o mirante.
Não tive coragem de subir, pois uma curta caminhada, em que contornamos dois quarteirões, já foi suficiente para me tirar o fôlego e dar aquela sensação de tontura típica das grandes altitudes.
Na pracinha principal há vendedores de balas de folha de coca, muito bem vindas nessa hora.
Salinas Grandes e a Cuesta de Lipán
Salinas Grandes e Cuesta de Lipán são atrações que só fazem sentido juntas. Digo “sentido” porque a Cuesta de Lipán é a estrada que faz chegar às salinas grandes, quarto maior deserto de sal das Américas.
A natureza mais bruta, as montanhas mais intocadas estão nessa parte de Jujuy. Fiquei estarrecida com os imensos cactos pintando de verde a íngreme encosta de montanhas há 6 mil metros de altitude.
Embora as salinas grandes lembrem Uyuni, somente o sal une os dois locais. A quebrada de Humauca, patrimônio da Humanidade, é um diferencial e tanto dessa região. Após percorrer uma estrada cheia de curvas, a uma velocidade baixa, chegamos aos 4.170 metros de altitude.
Cansa só de subir esse morrinho. Ao lado há uma senhora que vende balas de coca, a própria folha para mascar, chá e artesanato.
Seguimos até encontrar as Salinas Grandes no horizonte.
É possível se observar a salina do estacionamento, bem menos extensa que Uyuni, mas muito bonita. Para adentrar de carro, somente com guia local. Pagamos 300 pesos e uma guia nos acompanhou no carro.
O diferencial que me fez querer conhecer as Salinas Grandes foi as lagunas verdes que ali brotam e que não existem em Uyuni. Formadas há milhares de anos, de água azul ou esverdeada dependendo de que metal esteja preponderante na água.
As lagunas estão em uma parte mais fina e frágil do sal. Precisamos entrar em fila indiana e sempre acompanhados de perto pela guia. Há realmente o risco de ceder alguma parte do sal, o que é um pouco aterrorizante, já que as lagunas parecem fundas.
Como chegar a Jujuy e as atrações
Para chegar do Brasil a Jujuy é recomendável se pegar um vôo até o aeroporto de São Salvador de Jujuy (Horácio Guzmán), a 35km da cidade de Jujy, ou o aeroporto de Salta, a 117 km de San Salvador de Jujuy.
O deslocamento na província é perfeitamente possível em um carro alugado. As estradas são boas e bem sinalizadas e não pegamos nenhum ponto de difícil trânsito. Como não gostamos de dirigir, preferimos contratar um remis, que saiu cerca de R$300,00 por dia. Não vale a pena contratar para ir e voltar de Salta, pois a estrada não tem atrativos e pode ser feita em 1h30.
Há uma estrada que dizem ser muito bonita, cheia de curvas, entre Jujuy e Salta, mas preferimos ir pela auto pista. Dizem que essa estrada é indicada ir com motorista, pois não seria segura e não pega internet em todo trajeto.
Onde comer
São Salvador de Jujuy
A oferta de restaurantes em Jujuy não e grande. Conhecemos os dois melhores restaurantes listados no tripadvisor Viracocha e Manos Jujenas, o primeiro lotado, com comida regional muito farta e saborosa. Os vinhos servidos são os da região, geralmente com poucas opções de vinhos mais sofisticados.
Os vinhos normalmente têm preço muito acessível, mais baratos que as cervejas importadas. Uma média de R$18 a R$22,00. No Manos jujenas, restaurante pequeno, familiar, também de cozinha regional, mas com massas e saladas especiais no cardápio. Nos surpreendeu as empanadas.
Um bom lugar para tomar um chope artesanal ou uma cerveja é na frente da Praça principal, onde está o Palácio do governo de Jujuy.
Purmamarca
Em Purmamarca comemos no restaurante La Posta. Foi o mais caro, da região, ainda bem mais barato do que um restaurante do mesmo nível em Salvador. Os pratos variam entre R$30,00 e R$50,00 e a salada estava muito saborosa.
Humahuaca
Agora a grande surpresa da viagem, o melhor restaurante, inclusive melhores empanadas e melhor opção vegetariana, restaurante Aisito. Mais de duas opções vegetarianas de prato principal (que não eram saladas), inclusive uma opção vegana.
Onde se hospedar
Nós nos hospedamos no hotel Howard Johnson em São Salvador de Jujuy. Reservamos pelo Booking e foi uma boa escolha, embora tivesse preferido ficar em Pumamarca.
Aqui está a dica, reserve com antecedência. Não fizemos isso e como não existem muitas opções de hospedagem, principalmente em feriados como o carnaval, quase não achamos vagas.
O norte da Argentina não é muito falado aqui no Brasil, mas acredite, vale muito a pena conhecer.
Quer ler mais sobre a Argentina? Temos vários posts aqui.
7 Comentários
O Museu do Vinho em Cafayate, Argentina - Viagens Invisíveis
13 de maio de 2019 em 12:01[…] conhecer mais sobre o Norte da Argentina? Temos vários posts legais sobre esse […]
A Rota do vinho de Cafayate, Salta - Viagens Invisíveis
20 de maio de 2019 em 20:35[…] conhecer mais sobre o Norte da Argentina? Temos vários posts legais sobre esse […]
Raquel Cardoso Guirra
22 de maio de 2019 em 18:48Fico impressionada como você encontra estes lugares incríveis e realmente invisíveis para os turistas comuns como nós!!!!
viagensinvisiveis
5 de junho de 2019 em 19:14Surpreendem até a mim rsrs. O mundo é realmente incrível 🙂
Salta, La Linda cidade argentina - Viagens Invisíveis
15 de dezembro de 2019 em 21:28[…] diria que entre visões exóticas como a Quebrada de Humauaca de Jujuy e a Quebrada das Conchas de Cafayate, conheceríamos mais do que uma vitrine […]
fabiola
8 de janeiro de 2020 em 15:53ola
ficou hospedada em jujuy e de la fez todos os passeios?
vale a pena?
ou melhor em purmamarca?
viagensinvisiveis
14 de janeiro de 2020 em 09:03Olá Fabiola, sim fiquei em Jujuy e quando voltar ficarei em Purmamarca. É mais próxima dos lugares e mais charmosa que Jujuy 🙂